postado em 14/06/2022 10:45 / atualizado em 14/06/2022 10:45
Os desafios dos trabalhadores e suas entidades de classe na construção de uma nova ordem econômica e social permeou as discussões do quarto painel realizado, em 13/6, durante a programação do primeiro dia de debates do 6º Congresso Luso-Brasileiro de Auditores Fiscais.
Com a recém-aprovada reforma trabalhista espanhola, que revogou a anterior, a organização do Congresso convidou Dolores Segura de La Encina, conselheira de Trabalho, Migração e Seguridade Social da Embaixada da Espanha no Brasil, para explicar os mecanismos que foram adotados por lá.
Segundo Dolores, a nova reforma trabalhista é fruto de um amplo acordo entre organizações sindicais e empresarias. “É resultado de negociações em que nenhum dos lados quis sair vitorioso. Com isso, o governo acabou tendo um papel secundário na sua elaboração.”
A palestrante disse que uma das principais alterações trazidas pela reforma foi a inversão da lógica de contratação dos trabalhadores. De acordo com Dolores, cerca de 90% dos novos postos de trabalho na Espanha eram temporários. “Graças às alterações trazidas pela nova legislação, priorizando a generalização das contratações por tempo indefinido, houve um reequilíbrio nesta proporção.”
Dolores destacou ainda outros dispositivos que foram pensados para combater a precarização do trabalho e manter os postos criados. Ela citou, como exemplo, formação profissional contínua, simplificação dos contratos de trabalho, valorização da negociação coletiva e ampliação dos mecanismos de flexibilização dos contratos em momentos de crise econômica declarada oficialmente. “Foi criado o mecanismo chamado RED para proteger empregos e empresas em momentos de crise. Os contratos são suspensos, mas os vínculos empregatícios permanecem. Durante esse período, o trabalhador é amparado por políticas de proteção social. Quando ocorre a retomada da economia, as empresas voltam a chamar esses profissionais.”
A realidade brasileira
Na sequência do painel, o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Jr., introduziu sua fala afirmando que está sendo implantado um projeto no Brasil para tornar o País uma economia exclusivamente agroexportadora. Para isso, segundo ele, vem ocorrendo um processo de desregulamentação do Estado. Fausto citou, como exemplos de desmonte, as reformas trabalhista e previdenciária, já em vigor, e a administrativa, em discussão no Congresso Nacional. “A PEC 32 (que trata da Reforma Administrativa) não está enterrada como muitos querem fazer acreditar. Ela pode ser pautada para votação em plenário a qualquer momento.”
Para ele, o que está por trás desse projeto é a disputa por rubricas no orçamento público, seja via emendas parlamentares, seja por meio de terceirizações. “Por isso, é parte da estratégia culpar os servidores públicos pelas mazelas do País.”
Em seguida, o diretor do Dieese disse que o modelo agroexportador que vem sendo implantado amplia a informalização e a precarização mercado de trabalho. “Cerca de 44 milhões de trabalhadores estão desprotegidos pelas lei trabalhistas. Isso é consequência direta das perdas dos postos formais e da informalização do mercado.”
Segundo Fausto, um dos objetivos desse projeto de informalização é o enfraquecimento do movimento sindical. “São os sindicatos que organizam as grandes lutas, por isso, ao serem enfraquecidos, a própria democracia se torna mais fraca.”
No encerramento do painel, o presidente do Fórum Nacional de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques, abordou o tema sob a perspectiva dos trabalhadores do setor público.
No início de sua fala, Rudinei falou sobre a campanha por recomposição salarial promovida por servidores federais, cuja reivindicação não foi atendida pelo governo. Segundo ele, o Estado, ao não conceder reajuste, privilegia o mercado financeiro, no mínimo de duas maneiras. Ao usar esse dinheiro para remunerar o capital e ao endividar os servidores que se veem obrigados a recorrer aos empréstimos consignados. “Desde a última reposição salarial, o endividamento dos servidores com o consignado cresceu 80%.”
Em seguida, o presidente do Fonacate falou sobre o projeto de retirada de direitos e o aumento da crise socioeconômica. “Vimos uma onda de reformas por aqui que, somadas a inépcia na gestão da política econômica, se transformaram em quatro bestas do apocalipse. São elas: a reforma trabalhista, com a subtração de direitos; reforma previdenciária, que aumentou o tempo de contribuição e diminuiu o valor da aposentadoria; a retomada da inflação, que tirou dinheiro do bolso do trabalhador; e o retorno da fome no Brasil, que culminou com o caos total.
Falando sobre proposta do Executivo para Reforma Administrativa, por meio da PEC 32, Rudinei disse que todos os argumentos apresentados pelo governo foram refutados. “Disseram que o serviço público custa caro, a máquina está inchada e é ineficiente. Fomos para o debate no Congresso Nacional e demostramos, por meio de vários estudos, que todas essas premissas são falsas. O governo sequer conseguiu refutar alguma delas porque não tem análises para sustentar o contrário. Mostramos que a empregabilidade no setor público em países membros da OCDE é muito maior do que no Brasil. Além disso, o número de servidores vem diminuindo por aqui. Na União, temos cerca de 570 mil trabalhadores civis ativos. Em 1991, eram 650 mil. Ou seja, no período que a população cresceu 40%, o serviço público encolheu.” Para ele, o que está em disputa é o papel do Estado preconizado pela Constituição de 1988.
Ao final de sua fala, Marques disse que discussões realizadas no Fonacate resultaram de uma lista de comprometimentos que precisam ser assumidos pelo candidato à presidência da República que deseje ter o apoio do serviço público. Entre os compromissos, o candidato precisa se comprometer com a constituição de um estado de bem-estar social, com a redução das desigualdades sociais regionais; revisão do teto de gastos e o aprimoramento do arcabouço fiscal visando a retomada da capacidade de investimento e implementação de políticas públicas; um sistema tributário efetivamente progressivo, com redução da tributação sobre o consumo a ampliação sobre o patrimônio e a renda; revisão da reforma trabalhista e erradicação do trabalho escravo; adoção de políticas de inovação no setor público; entre outras.
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