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Informe Jurídico nº 10

postado em 19/10/2018 3:54 / atualizado em 19/10/2018 3:55

Informe Jurídico nº 10
Data:
22/09/2011

Confiram abaixo decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, bem como decisão pelo reconhecimento de Repercussão Geral em Recurso Extraordinário em que se debate a constitucionalidade, ou não, da incidência de ICMS sobre o fornecimento de água encanada por empresa concessionária, a saber:

 

 Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior – 1


O Plenário iniciou julgamento de recursos extraordinários em que discutida a obrigatoriedade, ou não, da retenção na fonte e do recolhimento de imposto de renda, no ano-base de 1993, quanto a dividendos enviados por pessoa jurídica brasileira a sócio residente na Suécia. Na espécie, não obstante a existência de convenção internacional firmada entre o Brasil e aquele Estado, a qual assegura tratamento não discriminatório entre ambos os países, adviera legislação infraconstitucional que permitira essa tributação (Lei 8.383/91, art. 77 e Regulamento do Imposto de Renda de 1994 – RIR/94), isentando apenas os lucros recebidos por sócios residentes ou domiciliados no Brasil (Lei 8.383/91, art. 75). A pessoa jurídica pleiteara, na origem, a concessão de tratamento isonômico entre os residentes ou domiciliados nos mencionados Estados, com a concessão da benesse. Alegara, ainda, que, nos termos do art. 98 do CTN, o legislador interno não poderia revogar isonomia prevista em acordo internacional. Ocorre que o pleito fora julgado improcedente, sentença esta mantida em sede recursal, o que ensejara a interposição de recursos especial e extraordinário. Com o provimento do recurso pelo STJ, a União também interpusera recurso extraordinário, em que defende a mantença da tributação aos contribuintes residentes ou domiciliados fora do Brasil. Sustenta, para tanto, ofensa ao art. 97 da CF, pois aquela Corte, ao afastar a aplicação dos preceitos legais referidos, teria declarado, por órgão fracionário, sua inconstitucionalidade. Argumenta que a incidência do art. 98 do CTN, na situação em apreço, ao conferir superioridade hierárquica aos tratados internacionais em relação à lei ordinária, transgredira os artigos 2º; 5º, II e § 2º; 49, I; 84, VIII, todos da CF. Por fim, aduz inexistir violação ao princípio da isonomia, dado que tanto o nacional sueco quanto o brasileiro têm direito a isenção disposta no art. 75 da Lei 8.383/91, desde que residentes ou domiciliados no Brasil.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

 

Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior – 2


O Min. Gilmar Mendes, relator, proveu o recurso extraordinário da União e afastou a concessão da isenção de imposto de renda retido na fonte para os não-residentes. Julgou, ademais, improcedente o pedido formulado na ação declaratória, assentando o prejuízo do apelo extremo da sociedade empresária. Ante a prejudicialidade da matéria, apreciou, inicialmente, o recurso interposto pela União, admitindo-o. Assinalou o cabimento de recurso extraordinário contra decisão proferida pelo STJ apenas nas hipóteses de questões novas, lá originariamente surgidas. Além disso, apontou que, em se tratando de recurso da parte vencedora (no segundo grau de jurisdição), a recorribilidade extraordinária, a partir do pronunciamento do STJ, seria ampla, observados os requisitos gerais pertinentes. No tocante ao art. 97 da CF, consignou que o acórdão recorrido não afastara a aplicação do art. 77 da Lei 8.383/91 em face de disposições constitucionais, mas sim de outras normas infraconstitucionais, sobretudo o art. 24 da Convenção entre o Brasil e a Suécia para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre a Renda e o art. 98 do CTN. Isso porque essa inaplicabilidade não equivaleria à declaração de inconstitucionalidade, nem demandaria reserva de plenário. Quanto à suposta afronta aos artigos 2º; 5º, II e § 2º; 49, I; 84, VIII, todos da CF, após digressão evolutiva da jurisprudência do STF relativamente à aplicação de acordos internacionais em cotejo com a legislação interna infraconstitucional, asseverou que, recentemente, esta Corte afirmara que as convenções internacionais de direitos humanos têm status supralegal e que prevalecem sobre a legislação interna, submetendo-se somente à Constituição. Salientou que, no âmbito tributário, a cooperação internacional viabilizaria a expansão das operações transnacionais que impulsionam o desenvolvimento econômico, o combate à dupla tributação internacional e à evasão fiscal internacional, e contribuiria para o estreitamento das relações culturais, sociais e políticas entre as nações.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

 

Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior – 3


O relator frisou, no entanto, que, pelas peculiaridades, os tratados internacionais em matéria tributária tocariam em pontos sensíveis da soberania dos Estados. Demandariam extenso e cuidadoso processo de negociação, com a participação de diplomatas e de funcionários das respectivas administrações tributárias, de modo a conciliar interesses e a permitir que esse instrumento atinja os objetivos de cada nação, com o menor custo possível para a receita tributária de cada qual. Pontuou que essa complexa cooperação internacional seria garantida essencialmente pelo pacta sunt servanda. Nesse contexto, registrou que, tanto quanto possível, o Estado Constitucional Cooperativo reinvindicaria a manutenção da boa-fé e da segurança dos compromissos internacionais, ainda que diante da legislação infraconstitucional, notadamente no que se refere ao direito tributário, que envolve garantias fundamentais dos contribuintes e cujo descumprimento colocaria em risco os benefícios de cooperação cuidadosamente articulada no cenário internacional. Reputou que a tese da legalidade ordinária, na medida em que permite às entidades federativas internas do Estado brasileiro o descumprimento unilateral de acordo internacional, conflitaria com princípios internacionais fixados pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (art. 27). Dessa forma, reiterou que a possibilidade de afastamento da incidência de normas internacionais tributárias por meio de legislação ordinária (treaty override), inclusive em sede estadual e municipal, estaria defasada com relação às exigências de cooperação, boa-fé e estabilidade do atual panorama internacional. Concluiu, então, que o entendimento de predomínio dos tratados internacionais não vulneraria os dispositivos tidos por violados. Enfatizou que a República Federativa do Brasil, como sujeito de direito público externo, não poderia assumir obrigações nem criar normas jurídicas internacionais à revelia da Constituição. Observou, ainda, que a recepção do art. 98 do CTN pela ordem constitucional independeria da desatualizada classificação em tratados-contratos e tratados-leis.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

 

Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior – 4


Ressaltou, também, inexistir justificativa para a restrição da cooperação internacional pelo Brasil por motivos de regramentos típicos de âmbito interno. No que concerne ao art. 150, II, da CF, distinguiu a vedação à discriminação da isonomia tributária. Mencionou que, por intermédio daquela, prevista no tratado internacional em apreço, os Estados pactuantes acordaram não conferir tratamento desvantajoso aos súditos do outro Estado-parte, sem impedir, no entanto, eventual tratamento mais benéfico. Considerou, por outro lado, que o acórdão recorrido tornara equivalentes situações incomparáveis, ao misturar critérios distintos como a residência e a nacionalidade. Aduziu que o elemento de conexão predominante na convenção Brasil-Suécia (art. 24) — e geralmente tutelado na vedação à discriminação em todos os tratados contra a bitributação da renda — seria a nacionalidade. Por sua vez, a Lei 8.383/91 utilizou a residência como critério, ao estipular a alíquota de 15% no imposto de renda na fonte incidente sobre lucros e dividendos de residentes ou domiciliados no exterior. Assim, enquanto os residentes no Brasil foram isentos dessa exação por lucros e dividendos apurados em 1993 (Lei 8.383/91, art. 75), os residentes no exterior foram tributados, independentemente da nacionalidade do contribuinte. Logo, a legislação brasileira assegurara ao súdito sueco a isenção, desde que residente no Brasil. Considerou que o acórdão adversado, em ofensa ao art. 150, II, da CF, confundira o critério de conexão nacionalidade com o de residência, uma vez que estendera a todos os súditos suecos residentes no exterior benesses fiscais concedidas só aos residentes no Brasil. Aludiu que, atualmente, tanto os residentes como os não residentes estariam isentos do imposto de renda retido na fonte de rendimentos provenientes de dividendos ou lucros distribuídos por pessoas jurídicas tributadas no Brasil (Lei 9.249/95, art. 10). O relator arrematou, em suma, que: a) a cláusula de reserva de plenário, contida no art. 97 da CF, não teria sido violada; b) o art. 98 do CTN seria compatível com a nova ordem constitucional e sua subsunção, no caso, não transgrediria os artigos 2º; 5º, II e § 2º; 49, I; 84, VIII, todos da CF; e c) a extensão concedida pelo STJ ofenderia o art. 150, II, da CF, por ampliar, aos súditos suecos, tratamento não concedido aos nacionais brasileiros. Após, pediu vista o Min. Dias Toffoli.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

 

 

REPERCUSSÃO GERAL

 

ICMS e fornecimento de água encanada – 1


O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário, interposto pelo Estado do Rio de Janeiro, em que se discute, à luz do art. 155, II, da CF, a constitucionalidade, ou não, da incidência de ICMS sobre o fornecimento de água encanada por empresa concessionária. Ao ratificar jurisprudência do STF, o Min. Dias Toffoli, relator, desproveu o recurso. Aduziu que o tema fora objeto de análise na ADI 567 MC (DJU de 4.10.91), com decisão unânime pela suspensão liminar do ICMS sobre o fornecimento de água no Estado de Minas Gerais. Ressaltou, ainda, que, no julgamento da ADI 2224/DF (DJU de 13.6.2003) — embora não conhecida, na discussão do mérito, por questões processuais —, o Supremo acenara a tese da não-tributação, pelo citado imposto, da água fornecida como serviço público. Na seqüência, apontou que, nos autos, foram impugnados tanto o Convênio 98/99, que concedera a isenção, como o Convênio Confaz 77/95, ratificado pelo Governador daquele ente federado por meio do Decreto 21.845/95, além das Resoluções 2.679/96 e 3.526/99, ambas da Secretaria Estadual de Fazenda, que determinaram a exação adversada sobre os serviços de fornecimento de água canalizada na aludida unidade da Federação. Na esteira dos precedentes desta Corte, entendeu que a incidência do ICMS prevista na legislação fluminense geraria uma situação eivada de inconstitucionalidade, a destoar da materialidade deste tributo, inserta no art. 155, II, da CF (“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: … II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior”). Observou que, conquanto o fato gerador estivesse descrito na lei instituidora, o legislador infraconstitucional sujeitar-se-ia aos limites da hipótese de incidência estabelecida na Constituição. Concluiu, no ponto, que analisar a extensão dessa hipótese seria indispensável para identificar o que constitui, ou não, fato gerador do imposto em questão.
RE 607056/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 1º.9.2011. (RE-607056)


ICMS e fornecimento de água encanada – 2


No que concerne à noção de mercadoria, para fins dessa tributação, enfatizou que se trataria de bem móvel sujeito à mercancia ou, conforme a preferência, objeto de atividade mercantil. Consignou que as águas públicas derivadas de rios ou mananciais são qualificadas juridicamente como bem de uso comum do povo, consoante os artigos 20, III, e 26, I, da CF, não equiparáveis a uma espécie de mercadoria, sobre a qual incidiria o ICMS. Dessa forma, o tratamento químico necessário ao consumo não teria o condão de descaracterizar a água como um bem público de uso comum de todos. Assinalou que os conceitos de “operação”, “circulação” e “mercadoria” permaneceriam umbilicalmente ligados. No caso, reputou ausentes os elementos que adjetivariam o aspecto material da hipótese de incidência do ICMS, quais sejam: “circulação” e “mercadoria”, na medida em que as concessionárias — promotoras da operação de fornecimento de água — não deteriam poderes jurídicos de disposição sobre ela, tampouco poderiam lhe dar destinação comercial, dada a sua natureza de bem público. Afirmou, então, que esse entendimento seria corroborado pelo art. 18 da Lei 9.433/97, que “institui a Política Nacional de Recursos Hídricos”, ao deixar claro que a concessão do serviço público de distribuição de água canalizada constituiria mera outorga dos direitos de uso, sem implicar a alienação das águas, uma vez que se trata de bem de uso comum do povo, inalienável. No mesmo sentido, o Código de Águas (Decreto 24.643/34, art. 46: “concessão não importa, nunca, a alienação parcial das águas públicas, que são inalienáveis, mas no simples direito ao uso destas águas”).
RE 607056/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 1º.9.2011. (RE-607056)


ICMS e fornecimento de água encanada – 3


Asseverou que, ao tributar o fornecimento de água potável, estar-se-ia a conferir interpretação inadequada ao conceito de mercadoria, conduzindo, erroneamente, à classificação de água canalizada como bem de comércio. Salientou que a água natural encanada, ao contrário do que aconteceria com a água envasada, não seria objeto de comercialização, e sim de prestação de serviço público. Inexistiria, portanto, uma operação relativa à circulação de água, como mercadoria. Destacou que, em verdade, os concessionários detentores do direito ao uso desse bem prestariam serviços públicos essenciais de competência estatal, mediante a captação, o tratamento e o abastecimento de água – os quais compreenderiam um conjunto de serviços que visariam assegurar a universalidade e a qualidade de seu consumo, promovendo, desse modo, a saúde pública. Frisou que a doutrina abalizada não destoaria desse posicionamento. Registrou a jurisprudência consolidada nesta Corte no sentido de que o serviço de fornecimento de água é submetido ao regime de preço público e não de taxa, como manifesto no RE 54491 ED/PE (DJU de 16.6.65); RE 85268/PR (DJU de 1º.7.77) e RE 77162/SP (DJU de 9.8.77). Sublinhou que, no entanto, essa discussão seria irrelevante, pois incontroverso que se cuidaria de um serviço público posto à disposição da população, o qual, independentemente do regime jurídico remuneratório, não estaria sujeito à tributação. Além disso, considerou, por fim, que a incidência do ICMS sobre o serviço de água tratada não atenderia ao interesse público; ao contrário, poderia, inclusive, prejudicar políticas públicas de universalização do acesso a esse serviço. Após, pediu vista dos autos o Min. Luiz Fux.
RE 607056/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 1º.9.2011. (RE-607056)

 

 Fonte: Informativo nº 638 do Supremo Tribunal Federal – STF.

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