Febrafite

Notícias

Artigo | Caminhos possíveis para a educação fiscal

Por Fabiana Baptistucci 

postado em 22/09/2016 11:10 / atualizado em 29/09/2016 15:12

Fabiana Baptistucci, gerente nacional do PNEF. Foto: Daniel Nek/ESAF

Fabiana Baptistucci, gerente nacional do PNEF. Foto: Daniel Nek/ESAF

Abordar o tema da educação fiscal sob a ótica da função social do tributo nos parece oportuno e de extrema importância, no cenário atual do nosso país e do contexto internacional.

Assim, mostra-se crucial versar sobre a razão da existência, finalidades e propósitos dos tributos, trazendo algumas reflexões sobre democracia participativa, controle social, necessidade de se ensinar sobre a função social dos tributos nas escolas e aprofundar o debate na academia.

A propósito, defendemos que a educação fiscal seja matéria de concursos públicos e da formação dos servidores do Estado em todas as esferas e níveis de poder.

Sobre democracia participativa, tomemos como exemplo o cidadão que vai ao Fisco para resolver alguma pendência, buscar informações e reclamar da alta carga tributária. Será que ele tem noção de que ali não é o fórum adequado para registrar suas opiniões sobre a carga tributária? Saberá ele que democracia participativa requer que ele lembre, primeiramente, em quais parlamentares votou nas últimas eleições? E que deles deve cobrar sobre a incidência da carga tributária em sua vida? Além disso, será que esse cidadão está devidamente inteirado das novas formas de participação da sociedade nos destinos dos recursos públicos que os novos tempos propiciam?

Evidente que a percepção do que significa função social do tributo passa pelo entendimento do cidadão do que seja tributo, seus tipos, finalidades, esferas de competência para arrecadar, legislação pertinente e outros aspectos fundamentais para se entender sua gênese. O cidadão precisa, também e principalmente, ser cientificado de que a cobrança de tributos – e o consequente pagamento – é essencial para o financiamento do Estado e a satisfação das demandas individuais e do conjunto da sociedade. Ufa, quanta coisa!

É isso mesmo, controle social implica a efetiva participação dos cidadãos nas decisões sobre a aplicação dos recursos públicos e no respectivo monitoramento dessa aplicação. Urge, então, uma mudança cultural e de mentalidade, que leve à consciência da sociedade sobre o fato do Estado não ser dono dos recursos públicos e sim nós, cidadãos. Portanto, cabe-nos cuidar dos nossos interesses.

Controle social, por sua vez, começa a ser exercitado nas pequenas ações cotidianas – família, escola, bairro. Não nascemos pós-graduados em controle social, precisamos aprendê-lo, entronizá-lo, ampliar seu escopo e aproveitar os espaços existentes para disseminar a participação do cidadão.

O professor doutor Marciano Buffon, tributarista, destacou em sua tese que a Constituição Brasileira prevê a implantação de um Estado Democrático de Direito, construtor da igualdade social. Além de dizer o que somos, os princípios constitucionais regem nossos objetivos enquanto nação e são afirmados na Constituição como pilares que devem ser assegurados para a obtenção dos direitos fundamentais da sociedade.

De outra forma, porém, Buffon aborda o fenômeno denominado hipertrofia de direitos fundamentais, na medida em que a atual constituição consagra, no seu texto, uma expressiva gama de direitos – e poucos deveres- sem que haja a preocupação com a perspectiva de como financiar esses novos direitos e os tornar realidade. Ele salienta que o cidadão passa a ter uma postura de cliente do Estado e não de cidadão com responsabilidade na construção e no financiamento deste Estado.

Daí a importância de se ampliar a disseminação dos conceitos da Educação Fiscal que tratam do processo de construção de uma consciência voltada ao exercício da cidadania, objetivando e propiciando a participação do cidadão no funcionamento e aperfeiçoamento dos instrumentos de controle social e fiscal do Estado. Com um cidadão mais informado, solidário e participativo vamos conseguir consolidar um Estado mais justo, gerar um sistema tributário mais progressivo e converter impostos em obras e serviços de qualidade, sob o olhar vigilante desses mesmos cidadãos.

Como transformamos o discurso em prática cotidiana?

A consolidação do curso Disseminadores de Educação Fiscal tem se mostrado, ao longo dos últimos dez anos, uma das iniciativas mais efetivas para divulgar os conceitos de cidadania fiscal a todos os estados do país, com mais de 120 mil professores capacitados para levar o tema às salas de aula.

A rede atuante dos grupos de Educação Fiscal nos municípios e estados, bem como seus parceiros, fazem o Programa acontecer ano após ano. A Febrafite tem sido parceira da Educação Fiscal em todas as horas. Estamos na sexta edição do Prêmio Nacional de Educação Fiscal, com outros projetos que dão suporte firme ao Programa, como o desenvolvimento de um novo site, com arquitetura e design modernos, que nos permitirão ampliar a rede de parceiros e chegar à sociedade de forma mais dinâmica e atrativa.

Não obstante os progressos alcançados, agora precisamos ir mais longe. Estamos alcançando a academia, com acordos de cooperação com universidades, que preconizam a inclusão de estudantes de nível superior no debate do tema. Novos cursos estão sendo criados para ampliar os públicos, qualificar, enriquecer e dar maior consistência ao debate, incluindo conselheiros de políticas públicas e servidores públicos das três esferas.

Recentemente, houve aproximação do Programa Nacional de Educação Fiscal (PNEF) com a Comissão de Gestão Fazendária (COGEF), que está realizando com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) um trabalho sobre maturidade e desempenho da gestão fiscal, o qual poderá se tornar importante subsídio para as ações do PNEF.

Exemplo de iniciativa de caráter representativo e fiscalizador são os Observatórios Sociais, criados pela sociedade civil para acompanhar a aplicação de recursos públicos, buscar a transparência das contas públicas e desenvolver ações de Cidadania Fiscal.

Hoje são 104 observatórios localizados em 19 estados prescindindo de verbas públicas, possuindo independência político-partidária e caráter de voluntariado. Eles demonstram o potencial que representam para o desenvolvimento da democracia participativa.

Reflexões para o futuro

As rápidas mudanças nos ambientes político e econômico brasileiro e mundial ensejam debates sobre o futuro do Estado de bem-estar social. A população de idosos vem aumentando exponencialmente, proporcional ao aumento da expectativa de vida. Mesmo os países que possuem políticas públicas inclusivas e abrangentes, até então consideradas de primeiro mundo, estão revendo suas práticas, pressionados pelas levas migratórias e pelo espírito crítico e reticente dos cidadãos sobre o aumento da carga tributária.

No caso específico do Brasil, houve investimentos em políticas sociais, mas eles precisam ser ampliados com a ajuda da população, que claramente demonstra desejar, um serviço público eficiente e eficaz, focado em desempenho e resultados.

Aos governantes cabe aplicar os recursos de forma racional e com transparência, que vai muito além de apenas publicar balanços em seus sites ou na imprensa em geral.

Os desafios são os de popularizar a Educação Fiscal e torná-la mais visível na mídia, com abordagem franca e diálogo permanente.

Ao compreender que os benefícios decorrentes da aplicação dos tributos devem ser apropriados de forma coletiva, o cidadão terá assimilado, também, o conceito de solidariedade, já que os retornos nem sempre beneficiam diretamente seu bairro ou sua cidade, mas toda a Nação.

*Fabiana Baptistucci é administradora, servidora pública Federal de nível superior, especialista em Educação Fiscal pela Escola de Administração Fazendária (ESAF). É gerente do Programa Nacional de Educação fiscal (PNEF).  Artigo originalmente publicado na REVISTA FEBRAFITE, edição de agosto de 2016.

Leia também:

Copyright © 2024. Associação Nacional das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais - Todos os direitos reservados.